Career Insights

Por Marcelo Nobrega 

 

Se você ocupa uma posição C-level e pensa dessa maneira, pare imediatamente! Este sentimento já pode ter sido verdadeiro — e até desejado —, mas hoje certamente não deve ou precisa ser assim.

Existem algumas razões para que a frase “a posição de CEO é muito solitária” seja repetida com certa frequência. De fato, fiz uma breve consulta online sobre o tema e encontrei muitas referências reforçando o mito e usando-o como justificativa para vender livros, cursos, coaching e outras soluções mirabolantes.

Antes de ver algumas alternativas à solidão, vamos explorar a razão de ser deste fenômeno da vida corporativa.

Segundo os dicionários, Chief é o membro de maior autoridade em um grupo organizado de pessoas. O CEO tem responsabilidade final por decisões que determinam o destino de uma organização. Ele(a) é, em última instância, às vistas dos acionistas, do conselho, da diretoria e colaboradores, do público e dos demais stakeholders, o responsável pelo fracasso ou sucesso da organização. Essa responsabilidade pode ser isoladora, se o CEO sente que não tem colegas com o mesmo nível de autoridade com quem possa discutir e compartilhar tomadas de decisões — e a mídia e a literatura do management reforçam esse pensamento, endeusando os CEOs que carregam histórias de sucesso à frente de empresas renomadas, como Jack Welch, Sam Walton e Meg Whitman (citando alguns nomes das antigas). É a celebração do “Everest corporativo”. Cabe lembrar, porém, que essa escalada passa necessariamente pelo “vale da morte”. E aí encontramos CEOs responsáveis por retumbantes fracassos, que acabam recebendo muito mais do que seus 15 minutos de fama; vide Elizabeth Holmes e Sam Bankman-Fried (exemplos mais recentes). Elon Musk consegue figurar nas duas listas, sendo um personagem muito maior do que suas empresas Tesla, SpaceX e Twitter (ou X). Toda a responsabilidade pelos erros e acertos de suas empresas lhe são atribuídos.

De fato, há uma expectativa elevada em relação ao desempenho de um CEO e dos demais membros do C-level. São os homens e mulheres que têm todas as respostas certas.

Outro argumento comumente usado para explicar o insulamento de executivos C-level é o acesso a informações confidenciais e estratégicas que não podem ser compartilhadas livremente. Nos dias de hoje, alguém ainda acredita que se pode manter um segredo por muito tempo? Ok, concordo que algumas raras situações podem ser, temporariamente, restritas a poucas pessoas. Mas se transparência e confiança são ingredientes básicos para a construção de equipes de alta performance (vide Lencioni), é bom que executivos C-level possam contar com a discrição de seus times.

Minha perspectiva é que os executivos C-level que sofrem de solidão o fazem de modo autoinfligido — ou seja, a situação é assim porque querem, porque gostam. E querem porque corresponde ao que é esperado, até por eles mesmos, em relação à imagem do super-herói corporativo. Antes de subir a escada rolante, eles também admiraram e almejaram ser um C-level solitário, mas todo-poderoso. É bonito ser o tomador das grandes decisões. Dá status, inspira respeito e admiração. 

E por falar em status, ele é parte da contrapartida da solidão. É claro que existe um status positivo, símbolo do respeito pela posição e valor gerado. E isso vem de ajudar a equipe, de trazer bons resultados para a empresa e para as pessoas que nela trabalham. Criar senso de pertencimento e celebrar as conquistas individuais e coletivas. E promover o desenvolvimento pessoal e profissional de todos.

Para mim, status tem um significado negativo, pois remete aos símbolos artificiais de poder que procuram impor respeito e distanciamento. O que era o paletó senão um artefato que marcava território e causava distanciamento? E as expressões de tratamento como “doutor” e “comandante”? Quer mais? E a gravata de grife, o monograma na camisa, a caneta e o relógio caros?

Isso tudo me faz lembrar de um executivo com quem trabalhei. Enquanto todos os membros da diretoria compartilhavam um pool de assistentes, ele exigia ter uma secretária totalmente dedicada a ele. E outra das suas exigências era ter uma mesa com tampo de mármore. Bizarro! Sua secretária convocava membros da equipe para “audiências”. Não me recordo do ROI da mesa de mármore, mas ele não durou muito tempo.

Quem se preocupa demais com vaga de estacionamento, elevador privativo, restaurante ou banheiro executivo, realmente tem pouco tempo para fazer o trabalho que se espera de um executivo C-level.

Liderança é um esporte de contato

Quem tem todas as respostas ainda não se deu conta de que o mundo mudou e continuará mudando. A habilidade do futuro é fazer perguntas. E para fazer perguntas é necessário humildade, curiosidade, ter pessoas plurais à sua volta e interesse genuíno por elas.

Um executivo C-level tem toda a empresa à disposição para uma boa conversa. Vou além, estão todos ávidos por contribuir. Então, saia da sua sala e ande pelos corredores da empresa. Puxe conversa. Visite os escritórios, as fábricas e os pontos de venda. Converse e ouça muito. Mentore e tenha mentores. Peça opiniões e conselhos. É incrível o que essa abertura pode fomentar em termos de inovação e alcance de metas. Faça com que as pessoas participem das decisões, deem ideias, desafiem o status quo e se sintam ouvidas e participantes nas tomadas de decisão. Interaja fora da empresa também, até com os consumidores e clientes dos seus concorrentes.

Essa prática já foi batizada como management by walking around e aparece no clássico de 1982, In Search of Excellence (publicado no Brasil como Vencendo a crise), de Peters e Waterman. HP e Toyota parecem ter sido seus precursores. Esse hábito se desdobra em outros momentos de muita troca como benchmarking, brainstorming e focus groups.

Definir o escopo de trabalho, dar direcionamento, prover recursos, fomentar o crescimento e motivar são as atribuições do líder. Isso só se consegue com contato e proximidade. As conversas 1:1 de feedback e desenvolvimento de carreira criam confiança e colaboração. Sua equipe lhe aguarda. Não espere que eles tomem a iniciativa.

Para acabar com a solidão corporativa, converse mais. Está em suas mãos — e em suas cordas vocais e ouvidos.

Marcelo Nobrega

Conselheiro | Assetz Expert Recruitment

Consultor de Inovação e Tecnologia aplicada à Gestão de Pessoas. Investidor anjo e conselheiro de HR Techs. Membro do board editorial da Revista HSM Management. Professor do Mestrado da FGV-SP e de cursos de pós-graduação em várias instituições. Executivo com experiência em empresas dos setores financeiro, de petróleo e gás, bens de consumo, serviço de transporte aéreo e alimentício. É especialista em coaching de executivos, gestão da mudança e desenvolvimento organizacional e de lideranças. Suas experiências profissionais incluem projetos de transformação de estratégia e cultura corporativa em empresas nacionais e multinacionais, tanto no Brasil, como na América Latina e nos EUA, no contexto de aquisições, fusões e spin-offs. Possui bacharelado e mestrado em Ciência da Computação pela Universidade de Columbia, em Nova York, e doutorado em Engenharia de Produção pela COPPE/UFRJ. Possui ainda MBA em Finanças pelo IBMEC e MBA em Negócios de Petróleo e Gás pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e formação como Conselheiro pelo IBGC, CELINT e INOVA Business School. Autor e co-autor de diversos livros na área de gestão.