Career Insights

Uma memória muito gostosa da minha infância foi uma viagem em família, em que saímos de Belo Horizonte para passar um tempo em Florianópolis. Uma distância de aproximadamente 1.400 Km, numa época em poucas estradas eram duplicadas. Aliás, fato que não mudou muito, se excluirmos São Paulo do resto do Brasil. Com crianças no carro, a distância foi percorrida em poucos dias, com pernoites estratégicas. Lembro do meu pai com aquele “mapão” rodoviário do Brasil, com os trechos a serem percorridos marcados com pincel atômico e os pontos de parada circulados. De tempos e tempos, nos postos de gasolina, meu pai abria aquele mapa enorme sobre o capô do carro para uma rápida sessão de verificação e replanejamento. Por força de lei, os postos fechavam à noite e aos finais de semana. Tudo tinha de ser muito bem planejado.

O paralelo que quero fazer aqui é com a gestão das nossas carreiras e das nossas vidas. Vejo que nós às vezes ligamos o “piloto automático”, imputamos as coordenadas do destino e simplesmente seguimos a “rota delineada”, obedecemos aos comandos de “vira aqui, vira ali”, certos de que isso é o melhor para nós e sem fazer as sessões de verificação e replanejamento, quando colocamos o “mapão” à nossa frente, de forma a desafiar se as premissas anteriores continuam válidas e se aquele caminho de fato faz sentido, à luz de novas informações.

Depois de 35 anos de estrada, com erros e acertos, alguns pontos que considero com diferenciais para uma gestão da carreira, são os seguintes:

· Faça o seu próprio mapa e reavalie de tempos em tempos: Um mapa de carreira inteligente deve ter um ponto de partida, um ponto final de longo prazo e os milestones intermediários. Isso pode ser definido em termos de cargos ou posições, especialmente quando se trata que um mapeamento dentro de uma organização. Eu prefiro definir os pontos intermediários como experiências ou aprendizados que irão construir o(a) profissional com a qualificação necessária para o ponto final, seja em termos de hard skills, como soft skills (como sabem, prefiro chamá-los essencial skills). Muito importante, defina caminhos alternativos, pois nem sempre as coisas funcionam como queremos. Segue abaixo um exemplo, meramente ilustrativo:

 

· Não pense em cargo, pense em escopo: Muitas vezes colocamos muita ênfase no cargo, na promoção ou na mudança de nível gerencial e esquecemos se estamos realmente adquirindo a experiência, o conhecimento e a “massa muscular” que precisaremos lá na frente. É natural: todos queremos ganhar mais, ter títulos que nos deem status e ficar bem no LinkedIn. Mas, o fato é que ao fazer isso, podemos estar limitando nosso crescimento futuro. E depois, não se volta atrás para buscar a formação perdida. Carreira é como uma ultramaratona de estágios, e isso eu conheço bem. Quantas vezes vi pessoas forçarem o primeiro, segundo dia, me deixarem comendo poeira, para depois quebrarem pelo caminho.

Prestem particular atenção aos potenciais movimentos laterais que você pode fazer, especialmente se trabalha em uma organização de porte, com diversidade de operações, geografias e alto complexidade. Minha movimentação entre o nível de diretor até o de vice-presidente numa organização de grande porte, tomou 10 anos. Nesse período busquei todas as experiências que na minha visão poderiam fazer de mim um CFO robusto: fui controller, tesoureiro, liderei projetos de M&A, fui expatriado nos Estados Unidos e na Europa, entre outras coisas. E ainda assim, não foi simples a migração para o nível de VP. Mas essa é estória para outro dia.

· Mantenha foco naquilo que você controla e tenha flexibilidade e sabedoria para aceitar os fatos como são: Muitas das decisões que impactam nossas carreiras não estão sob o nosso controle. Inevitavelmente, algum movimento vai acontecer que não estará totalmente em consonância com a nossa expectativa ou vontade. A vida é assim e, quando acontece, não tem nada que possamos fazer para alterar as decisões dos outros. Contudo, podemos decidir como reagiremos, sobre qual será nosso próximo passo e, principalmente, como deixaremos esses eventos impactarem nossos sentimentos e racionalidade. Como relatei em um artigo passado, os filósofos Estoicos diziam que a mente é uma fortaleza que não pode ser tomada pelo exterior. Só pode ser entregue a partir do interior. Ou seja, podemos não ter controle sobre as decisões que impactam nossas movimentações, nossas promoções. Mas as nossas reações estão totalmente em nosso controle. Se “metemos os pés pelas mãos”, não podemos culpar ninguém. Somente nós mesmos.

Precisamos manter o foco naquilo que controlamos sempre: fazer o nosso melhor sempre, ter atenção aos detalhes, primar pela alta qualidade do nosso trabalho, aprender, desenvolver nossas habilidades e aproveitar as oportunidades de sempre surgem, seja na forma de projetos ou iniciativas. Muitas vezes, grandes oportunidades estão naquelas coisas que ninguém quer fazer, as famosas “buchas”. É aí que podemos fazer a diferença e mostrar que somos valiosos.

Agora, se as coisas não acontecerem exatamente como você queria: ponha a cabeça no lugar, entenda com clareza e isenção, abra o seu “mapão”, entenda as alternativas e possibilidades que tem. Decida com humildade e inteligência e siga!

O caminho de construção de uma carreira pode ser muito tenso, cheio de incertezas sobre se chegaremos ao ponto final ou não. Devemos evitar que esse caminho seja tão duro. Não precisa. A grande realidade é que, sim, devemos planejar, devemos nos preparar, mas devemos olhar isso com leveza, devemos aproveitar cada etapa, focando no que está à nossa frente. Mergulhar na experiência que está aqui e agora e tirar o melhor dela. O futuro terá o tempo dele. Não deixemos que ele roube nosso presente.

Em suas meditações, o filósofo Estoico e imperador romano Marco Aurélio disse o seguinte: “Se você trabalha naquilo que está à sua frente, seguindo a razão correta, com seriedade, vigor e calma, sem deixar que nada te distraia, …. sem esperar nada em troca, mas satisfeito em viver o agora de acordo com a natureza, dizendo a verdade de forma heroica em todas as suas palavras, você viverá feliz. E não há ninguém capaz de evitar que isso aconteça.”

Obrigado! Abraços e até a próxima!

No primeiro Career Insights do ano, Arthur Azevedo discute sobre carreira e planejamento, demonstrando que as suas chances de realização são sempre bem maiores quando você planeja e acompanha sua evolução com foco, humildade, inteligência, sabedoria e flexibilidade.

Arthur Azevedo

Finance Career Expert

Arthur Azevedo tem 34 anos de experiência na área de Finanças, tendo ocupado posições de liderança e gestão de pessoas nos últimos 27 e atuado como CFO por 11 anos. Trabalhou em várias localidades, incluindo Brasil, Estados Unidos e Europa. Atuou como CFO Global da Embraco, CFO Latam da Whirlpool Corporation e CFO Brasil da Transpetro, Cacau Show, Brasil Brokers e Tecumseh. É formado em Administração de Empresas pela Fundação Mineira de Educação e Cultura, com MBA pela Business School São Paulo com certificado como conselheiro pelo INSEAD (França e Singapura) e IBGC. É fundador da Arthur Azevedo Consultoria de Gestão & Mentoria. É casado, pai de dois filhos e apaixonado por corridas de rua.