Career Insights

Se você realmente quer escapar das coisas que o incomodam, o que precisa não é estar em um lugar diferente, mas ser uma pessoa diferente!

(Sêneca, filósofo estoico)

 

Se você lamentou uma promoção frustrada por mais tempo que deveria, se você se achou vítima do sistema, se acabou de assumir uma posição e já pensa na próxima promoção, ou se entende que o caminho de subida no organograma é o único que faz sentido, pare e reflita.

Pois bem! Não acontece só com a gente. Hoje, trago a história de um homem que alcançou o topo de uma categoria esportiva das mais disputadas e reverenciadas: a dos pesos pesados do boxe mundial. É uma história de superação, coragem, humildade e foco, daquelas que trazem vários ensinamentos sobre como abordar adversidades na vida e em nossa carreira, como aceitar o que não controlamos, como eventos indiferentes – nem bons, nem ruins – e como manter o foco naquilo que controlamos. Afinal, é somente isso que podemos fazer.

Joe Frazier, também conhecido pelo seu nome de luta, Smoking Joe, ex-campeão mundial de boxe na categoria pesos pesados, durante a chamada “era de ouro”, quando dividia o cenário com figuras da grandeza de Mohamad Ali, George Foreman, Ken Norton e Larry Holmes, relata, em sua autobiografia, a história de sua ida às Olimpíadas. Um exemplo de sabedoria, inteligência e, acima de tudo, humildade. Eu sou um fã e poderia escrever horas sobre ele. Na realidade, parte do personagem Rocky, de Silvester Stallone, foi baseado em sua vida: um garoto pobre, morador de Filadélfia, trabalhando num frigorífico, onde também treinava suas combinações nas carcaças e corria de madrugada pelas escadas do Museu de Arte. Mas, isso é outra conversa.

O fato é que. em 1964, Joe Frazier tinha 20 anos e uma carreira amadora impecável: 37 vitórias e apenas uma derrota para um boxeador que ainda encontraria como amador e como profissional – Buster Mathis. Joe havia conquistado o célebre título amador Golden Gloves por três edições e disputava as eliminatórias que definiriam a equipe que representaria os Estados Unidos nos Jogos Olímpicos, em Tóquio. As regras do boxer amador, em especial o Olímpico, são um pouco diferentes daquelas do boxe profissional. Mathis usava o calção bastante acima da linha da cintura, e Joe teve dois pontos descontados por um golpe que seria legal. Numa luta de apenas três rounds, esta diferença foi o suficiente para acabar com o seu sonho olímpico. Sua reação imediata foi deixar o boxe, encerrar sua carreira como um amador brilhante e seguir a vida. Afinal, apesar de ser jovem, já era casado e tinha três filhos.

Contudo seus treinadores e sua esposa insistiram para que ele se juntasse à delegação, não como parte do time oficial, mas como um sparing partner, que participa da preparação dos atletas e como suplente de Buster Mathis. Sua esposa, que trabalhava na Sears e ganhava $100 por semana, seria a provedora da casa. Os dois juntos decidiram assumir o risco. Pois bem, Mathis não tinha o foco e a determinação para seguir no sacrifício que envolvia a preparação para os jogos. Em uma contusão pouco significativa, deixou o time. Joe Frazier assumiu a posição e foi à disputa. Interessante, não? Mas nossa história não para por aqui, nosso herói fez uma campanha brilhante e chegou à final das Olimpíadas. Um pequeno detalhe: quebrou a mão esquerda nas semifinais. Ele sabia que se deixasse os médicos fazerem o raio-x, estaria fora da final. Pois bem, Joe Frazier escondeu a lesão e lutou a final das Olimpíadas na categoria dos pesos pesados com a mão quebrada e conquistou a medalha de ouro.

Fazendo uma ponte com o nosso mundo corporativo, vejo algumas atitudes de Joe Frazier, naquela época, um jovem de 20 anos, quando o mundo nem falava em psicologia positiva, comunicação não violenta ou em Essential Skills, deixar lições tão inspiradoras sobre a sabedoria com que soube lidar com uma grande decepção. Entre essas, destaco:

• Humildade e foco ao aceitar um papel coadjuvante no time olímpico, mesmo com uma carreira tão brilhante. Muitas vezes, vejo jovens profissionais que almejam as melhores posições nas empresas, mas, como costumo dizer, querem ser “generais antes de serem soldados(as)”. O caminho até o topo não é simples. Para se formar um CFO ou qualquer outro C-Level, é preciso vivência e repertório. Os melhores movimentos que fiz na minha carreira foram os movimentos laterais, quando expandi meus horizontes técnicos e comportamentais também. Foram por meio deles que minha musculatura cresceu e minha técnica tornou-se apurada e precisa. Os movimentos verticais, as promoções tão sonhadas devem ser a consequência, não o fim. Muitas vezes, o caminho ao Norte, passa pelo Sul.

• Cumplicidade e trabalho em equipe entre ele e Florence, sua esposa, que assumiram o risco juntos e fizeram sacrifícios com foco no que entendiam ser o melhor para o todo naquele momento. Isso é parceria cujas decisões de uma equipe precisam considerar o objetivo do grupo, ao mesmo tempo em que os esforços individuais sejam reconhecidos de forma justa. As necessidades do grupo devem se sobrepor às necessidades individuais para que os relacionamentos e as estruturas se sustentem no longo prazo. Em nossa vida, temos vários papéis, várias personas: profissional, pai, mãe, esposa, marido e outras. Em alguns momentos, é necessário concentrar esforços em alguma dessas personas para se chegar ao estado desejado. Mas, no longo prazo, precisamos buscar o equilíbrio entre elas e as fazer ouvidas, de maneira igualitária em nossas decisões.

• Pragmatismo e coragem para ouvir, verdadeiramente, aqueles comprometidos com o seu futuro, seguir a intuição e se manter na rota que entendia ser a correta. Seus treinadores conseguiam ver possibilidades que, no momento do stress, da derrota e da depressão, Joe Frazier não via. Quando seu líder, sua Business Partner de RH lhe diz que aquele não é o momento de sua promoção, que um movimento prematuro pode queimar sua carreira, é bom ouvir. Eles(as) podem estar certos(as), agindo em seu benefício no longo prazo. Quantas vezes, vi pessoas talentosas deixarem grandes organizações, cheias de oportunidades, porque “o timing da empresa não era o mesmo delas”. Hoje, vejo que eram pessoas que poderiam ter ido muito mais longe, mas faltaram paciência, autocrítica e coragem colocar a vaidade de lado. Às vezes, ficamos mais preocupados com o que vamos dizer ao “amigo” que nos alfineta sobre como fomos injustiçados ao não sermos escolhidos, do que com aquilo que nós mesmos pensamos. E o pior, começamos a acreditar nisso e a entrar no famoso ciclo da vitimização. A filosofia estoica, com que tenho me identificado mais e mais, por trazer a sabedoria de vida de forma prática e aplicada, encoraja-nos a encontrar oportunidades nas adversidades. Precisa pragmatismo e coragem para bancar e sustentar isso. Aconteceu comigo: uma promoção para uma posição frustrada, há algum tempo, deu-me a oportunidade de viver de forma inédita aspectos fundamentais da área financeira que não conhecida e, além disso, trabalhar sob uma das melhores lideranças da minha carreira. Ainda bem que não “chutei o balde”, apesar de ter sido este o meu impulso.

Aprendo muito com a trajetória de outras pessoas, especialmente de mundos diferentes do meu. Muitas analogias podem ser feitas, e muitos ensinamentos podem ser transpostos. A minha mensagem aqui é de que uma carreira precisa buscar a realização, antes do sucesso. A realização é pessoal, tem a ver com a satisfação dos seus anseios, busca do seu propósito, crescimento próprio e das pessoas que estão ao seu redor. Repassando meus 34 anos de carreira, os momentos em que fui mais feliz, quando senti que vivi plenamente meu propósito, foram aqueles em que criei conexões com pessoas e as ajudei a tomar as melhores decisões, usando as minhas competências. Isso sempre foi a minha força motriz e continua sendo. O sucesso, seja na forma de reconhecimento externo seja financeiro, virá como consequência. Acredite, é verdade!

Como sempre, deixo com você um pensamento de Marco Aurélio, imperador romano e filósofo estoico: “Muitas vezes me perguntei como é que todo homem se ama mais do que todos os outros homens, mas dá menos valor à sua própria opinião do que à dos outros”.

Um abraço e até a próxima!

Arthur Azevedo

Finance Career Mentor

Arthur Azevedo tem 34 anos de experiência na área de Finanças, tendo ocupado posições de liderança e gestão de pessoas nos últimos 27 e atuado como CFO por 11 anos. Trabalhou em várias localidades, incluindo Brasil, Estados Unidos e Europa. Atuou como CFO Global da Embraco, CFO Latam da Whirlpool Corporation e CFO Brasil da Transpetro, Cacau Show, Brasil Brokers e Tecumseh. É formado em Administração de Empresas pela Fundação Mineira de Educação e Cultura, com MBA pela Business School São Paulo com certificado como conselheiro pelo INSEAD (França e Singapura) e IBGC. É fundador da Arthur Azevedo Consultoria de Gestão & Mentoria. É casado, pai de dois filhos e apaixonado por corridas de rua.