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Um dos contrassensos mais comuns nas organizações é o de que cabe aos subordinados a responsabilidade de conhecer o estilo de seu líder e adaptar-se a ele, e de que há, nessa relação, uma responsabilidade menor do líder de, igualmente, conhecer os estilos de seus subordinados e adequar-se a eles. Via de regra, a melhor maneira de desembaraçar esse contrassenso – que muitas vezes é resultado da própria cultura organizacional – é através da proposição de uma simples pergunta: “qual é, afinal, o papel primário do líder?”. Alguns dizem que é o de “desenvolver pessoas”. Verdade. Outros dizem que é “motivar e inspirar pessoas”. Verdade, também. Porém, o papel primário do líder é trazer resultados. E, para tal, incumbe ao líder – e não aos subordinados – a maior responsabilidade de conhecer e adaptar seu estilo a fim de extrair o melhor de cada um e conseguir criar um ambiente de alta performance.

Em março de 2000, o pesquisador phD. Daniel Goleman disseminou, nas organizações, o termo “Estilos de Liderança” através de um artigo publicado na Harvard Business Review (Harvard Business Review, 3, 78-90). Utilizando como base uma pesquisa com cerca de 3.800 líderes, Goleman foi capaz de identificar, nesses líderes, seis grandes “Estilos” de liderança. Entende-se por “Estilos de Liderança” um padrão de comportamentos que um líder utiliza dentro de seu espectro de liderança nas mais variadas situações. Mais adiante, Goleman conseguiu identificar que líderes que sabem utilizar corretamente esses padrões de comportamentos, de acordo com as necessidades específicas de cada um dos seus subordinados e da situação, eram capazes de gerar um impacto positivo de até 75% no clima de sua equipe que, consequentemente, poderiam proporcionar um aumento de até 25% no desempenho do negócio.

Os seis estilos de liderança categorizados por Daniel Goleman são:

1. Coercitivo:

  • Modus operandi: demandar, dar ordens e controlar;
  • Estilo em uma frase: “Faça como eu estou dizendo”;
  • Motivadores subjacentes: conquistar metas e finalizar, sem muitos questionamentos, as demandas;
  • Quando utilizar: em momentos de crise, em momentos de turnaround ou quando há problemas de desempenho com seus subordinados;
  • Impacto na equipe: majoritariamente negativo.

 

2. Visionário:

  • Modus operandi: mobilizar através de uma visão ou um propósito;
  • Estilo em uma frase: “Venha comigo”;
  • Motivadores subjacentes: confiança no futuro, empatia, catalisador da mudança;
  • Quando utilizar: quando a organização ou o time precisam visualizar um objetivo diferente ou quando há uma necessidade de dar um direcionamento claro sobre expectativas;
  • Impacto na equipe: majoritariamente positivo.

 

3. Afiliativo:

  • Modus operandi: criar harmonia e relações de confiança;
  • Estilo em uma frase: “Pessoas primeiro”;
  • Motivadores subjacentes: empatia, construção de relacionamentos;
  • Quando utilizar: sanar as feridas de conversas difíceis ou quando há uma necessidade de motivar as pessoas em circunstâncias difíceis;
  • Impacto na equipe:

 

4. Democrático:

  • Modus operandi: fomentar consciência, responsabilização e empoderamento através da participação;
  • Estilo em uma frase: “O que você acha?”;
  • Motivadores subjacentes: colaboração, comunicação, escuta ativa de seus subordinados e responsabilização;
  • Quando utilizar: garantir aceitação da equipe, gerar conscientização ou responsabilização ou para receber inputs de subordinados valiosos (técnicos, ou mais experientes em algum tema);
  • Impacto na equipe:

 

5. Modelador:

  • Modus operandi: régua alta quanto a questões de entrega e desempenho;
  • Estilo em uma frase: “Faça como eu faço”;
  • Motivadores subjacentes: colaboração, liderança de equipes multidisciplinares e comunicação;
  • Quando utilizar: conquistar metas e finalizar, sem muitos questionamentos, as demandas ou para desenvolvimento e modelação de subordinados de níveis mais juniores;
  • Impacto na equipe:

 

6. Coach:

  • Modus operandi: desenvolver pessoas para o futuro;
  • Estilo em uma frase: “Tente isto”;
  • Motivadores subjacentes: desenvolvimento, comunicação aberta, escuta ativa, empatia;
  • Quando utilizar: ajudar um subordinado a melhorar sua performance ou para desenvolvê-lo num longo prazo;
  • Impacto na equipe:

 

De acordo com o pesquisador, para que o líder consiga cumprir o seu papel primário de entregar resultados, não utilizando apenas os estilos de liderança que geram impactos positivos na equipe, mas, sim, utilizando corretamente o estilo de liderança apropriado a depender das necessidades de seus subordinados e das situações, ele precisa ter desenvolvido todos os seis estilos de liderança e utilizar um ou outro de maneira consciente. Em uma situação, por exemplo, em que existe um problema de desempenho de seus subordinados, o líder precisa adaptar seu estilo e apresentar um padrão de comportamento mais voltado ao comando, controle e monitoramento, ainda que o impacto na equipe seja majoritariamente negativo. Da mesma forma que, em uma situação em que há a necessidade de desenvolver um talento ou um potencial sucessor, o líder precisa apresentar um padrão de comportamento mais voltado à orientação e à experimentação, servindo de amparo técnico e comportamental.

A chave para o líder “vestir” um estilo de liderança em detrimento de outro é a adaptabilidade. O líder precisa saber que, nos dias de hoje, poucas situações são realmente permanentes e que seus subordinados têm histórias diferentes (conjunto de motivadores, de crenças e de valores), o que o leva à responsabilidade de conhecer essas realidades e adaptar-se a elas. Assim, aumentam suas chances de trazer resultados e cumprir, finalmente, seu papel primário dentro das organizações. A adaptabilidade não está apenas na maneira de agir (de expressar comportamentos), mas, também, na maneira de pensar: sair, com certa frequência, da zona de conforto, mudar hábitos e rotinas são os primeiros passos de um líder capaz de gerar um ambiente de alta performance.

No universo de Finanças, o estilo de liderança é claramente impactado pelas rotinas específicas da área. O cumprimento de prazos (curtos e inegociáveis), a pressão pela publicação de Demonstrações Financeiras fidedignas, a manutenção diária do caixa e do capital de giro da empresa e a necessidade de uma acuracidade cada vez maior do forecast são exemplos de como as rotinas da área podem impactar diretamente o estilo de liderança do líder de Finanças. Além disso, o líder de Finanças possui, naturalmente, habilidades comportamentais completamente diferentes das observadas em líderes de outras áreas, como Vendas, Marketing e Operações. Capacidade analítica, rigidez técnica e orientação à entrega são exemplos de habilidades natas do líder financeiro, que também acabam impactando o seu estilo. Nos primeiros cargos de liderança (Gerentes Sêniores, Gerentes e Coordenadores), dois estilos de liderança têm se mostrado mais dominantes: o estilo de liderança coercitivo e o estilo de liderança modelador – gerando, portanto, impactos negativos na equipe e, consequentemente, no desempenho do negócio. Quando olhamos para cargos de Diretoria e de Vice-Presidência, outros estilos de liderança começam a se mostrar mais dominantes: encontramos, com mais frequência, líderes com o estilo de liderança democrático (haja vista que muitas decisões precisam ser tomadas de maneira mais participativa) ou o estilo de liderança visionário (haja vista que, hoje, o executivo de Finanças é um dos maiores responsáveis por transmitir para toda a empresa os objetivos futuros da organização e gerar engajamento) mais desenvolvidos.

Com isso, a fim de trazer mais experiências e textura a esse tema, convidamos três Executivos de Finanças para compartilharem suas visões e perspectivas.

Cristina Procopio

CFO | Profarma Specialty/AmerisourceBergen

Elisangela Ranieri

Diretora de Recursos Humanos e Comunicação | Chiesi Brasil

Samuel Suart

Diretor de Finanças – América Latina | Biogen

Como você enxerga a utilização de diferentes estilos de diferença adaptados para diferentes subordinados em diferentes situações?

Cristina Procopio: Vejo com naturalidade a utilização de diferentes estilos de liderança, até porque as pessoas se motivam de formas diferentes. O grande objetivo é encontrar a fórmula de motivação de cada subordinado levando em consideração suas características individuais, seu trabalho e a cultura organização na qual está inserido. Para isso, é necessário conhecer o colaborador, o que o move, o que ele valoriza no ambiente, quais são seus planos profissionais, enfim, precisamos estar próximos para conhecê-los. Com isso, o engajamento do colaborador aumenta, gerando mais potencial de gerar resultados.

Elisangela Ranieri: Diria que as principais diferenças se concentram no campo da execução, pois, em empresas nacionais, o CFO tem poucos recursos e por isso tem que ser mais hands on. Além disso, obrigatoriamente, ele tem que entrar mais no controle interno para que as coisas funcionem, balanceando com suas funções financeiras e estratégicas. E por fim, o CFO é um profissional muito mais generalista, que agrega, muitas das vezes, responsabilidade por outras áreas operacionais.

Samuel Suart: O momento de mudanças em que todos nós estamos vivendo forçou a liderança a ter mais empatia e a adaptar o estilo de liderar com foco no indivíduo e não somente no resultado que a organização quer atingir. Considero saudáveis essas diversidades de estilos não só para a área, mas para a organização como um todo. Por exemplo aqui na Biogen realizamos não só com a liderança, mas com todo o time de finanças o “Insigths Discovery”, o qual tem suas raízes no trabalho do psicólogo suíço Carls Jung. Em resumo é um modelo de quatro cores que pode ajudar nosso colaborador a descobrir quem ele realmente é (estilos) e como interage com outros membros. Esses resultados foram compartilhados com todo o time de Finanças (previamente autorizado pelos colaboradores) e assim foi possível entender não só as preferências, bem como possíveis pontos “cegos” e por fim as fortalezas de cada indivíduo. Novamente o objetivo não é mudar o estilo dos nossos profissionais e sim ajudá-los no autoconhecimento.

Na sua visão, os líderes da área de Finanças possuem algum estilo de liderança predominante? Qual?

Cristina Procopio: A área de finanças está em transformação mais intensa nos últimos 20 anos. Passando para além de uma área processual de back office para também se tornar uma área que participa das decisões de negócio e estratégia. Com isso, tanto a liderança quanto os subordinados são medidos de forma completamente diferente. Passamos a ter colaboradores inseridos nas áreas de negócio gerando a necessidade de entendimento do todo da operação. Fornecer dados críticos nos momentos de alinhamento entre as áreas, desenvolver a confiança entre áreas parceiras e fazer parte de projetos multifuncionais são pilares para geração de resultados na Cia. Dessa forma, os estilos “coercitivo” e “modelador” não devem fazer mais parte do repertorio de líderes de finanças – é um engano achar que trazem mais resultados pelo pragmatismo desses estilos. Liderar hoje é ouvir, entender a fundo o negócio e seus problemas internos e externos sendo sua principal ferramenta a gestão de pessoas, identificando onde e como os colaboradores podem performar mais – tudo isso dá mais “trabalho”! Transitar entre democrático, coach, afiliativo ou visionário, é essencial neste momento. O líder passa a se doar mais às pessoas e gestão de desenvolvimento de times, assim trazendo resultado para cia através delas.

Elisangela Ranieri: Na minha opinião, não. Entendo que o estilo de liderança está mais focado na história de vida de cada um do que na própria área profissional de atuação. Embora, podemos também pensar que líderes da área de Finanças apresentam algumas similaridades nas suas experiências profissionais e planos de desenvolvimento. Ao longo da minha trajetória profissional, eu tive a oportunidade de conhecer líderes de Finanças de diferentes segmentos, senioridades, culturas e com diversos estilos de liderança também.

Eu tive a oportunidade de trabalhar tanto com “bons líderes” quanto com “maus líderes” de Finanças, mas consigo perceber que aqueles que exerciam predominantemente um único estilo de gestão foram os que tiveram maior dificuldade para influenciar e engajar um time, já que a prática da sua gestão era mais orientada em si próprio do que nas pessoas.

Samuel Suart: No passado o estilo predominante era o modelador e o controlador. Atualmente as empresas exigem uma combinação dos estilos democrático, visionário e coach, pois o profissional de finanças além de organizar e planejar as Finanças também precisa participar ativamente das discussões estratégicas, desenvolvimento de talentos, avaliação e impactos de novas tecnologias, novos modelos de negócios bem como antecipar eventuais mudanças no comportamento dos clientes – “customer journey”, pois todos esses fatores impactarão o negócio de alguma forma. Além disso, a interação com as demais áreas da empresa tornou-se fundamental para qualquer líder de Finanças.

Os profissionais atuantes nas diferentes disciplinas de Finanças (contabilidade, FP&A, Tesouraria etc.) apresentam características comportamentais e anseios distintos. Na sua opinião, há a necessidade de se adaptar o estilo de liderança aos subordinados dos diferentes subsistemas da área financeira?

Cristina Procopio: As características comportamentais e anseios distintos se devem mais ao fato de sermos indivíduos distintos do que qualquer outra questão. Os objetivos de resultado e competências desenvolvidas são diferentes em cada área, mas isso não muda o estilo de liderança. O que muda o estilo de liderança é a situação de desenvolvimento, contexto de vida e características pessoais que geram a necessidade de uma linguagem adaptada para que o colaborador possa alcançar seu máximo de potencial na posição.

Elisangela Ranieri: Na minha opinião, não acho que devemos olhar para as diferentes disciplinas da área de Finanças, mas sempre para o indivíduo em si. Ele tem que ser o foco do líder, do contrário, corremos o risco de pré-julgar os colaboradores de uma determinada função pela área em que ele trabalha e pelas características comuns que são predominantes de cada uma delas e não enxergar as reais necessidades que um colaborador pode trazer e que são inerentes a ele e não a área que atua.

Samuel Suart: De fato, mais do que se adaptar-se ao estilo de cada disciplina de Finanças, o líder terá que adaptar-se ao estilo de cada indivíduo. Vou mais além, por exemplo quando você lida com profissionais de diferentes países, o líder precisa entender como cada uma dessas culturas funciona até mesmo para conseguir comunicar-se de maneira mais efetiva, respeitando as peculiaridades de cada um. Isso até parece obvio, porém em minha experiência profissional, vejo que a maior dificuldade na comunicação da liderança com diferentes países não é somente por exemplo da falta da fluência da língua inglesa ou espanhol, mas da falta de entendimento da questão cultural de cada país.

Quais são os maiores benefícios operacionais gerados para a área de Finanças quando um líder possui bem desenvolvidos os estilos de liderança e os utiliza de maneira correta?

Cristina Procopio: Os maiores benefícios operacionais são voltados para melhoria de resultado como um todo. Áreas parceiras passam a consultar finanças nas tomadas de decisão, estruturando os reais cenários consequentes e definindo a estratégia do negócio. O planejamento de negócio passa a ter conexão com o dia a dia, e a operação busca eficiência para alcançar maiores resultados. Tudo isso com muita transparência e informação, sendo disponibilizados pelo time de finanças. É uma construção de confiança, e grandes elos são formados entre as áreas em busca de um único objetivo – lucro operacional.

Elisangela Ranieri: Eu diria que os benefícios são os mesmos para todas as áreas da Organização. A forma como a liderança é exercida pode influenciar muito na produtividade do colaborador e no clima organizacional como um todo. Quando se tem um líder bem-sucedido, você tem um time motivado, engajado no mesmo propósito e disposto a buscar performances excepcionais em busca de um objetivo comum.

Samuel Suart: Eu elencaria engajamento da equipe com a organização, baixo “turnover” de profissionais, sentimento de pertencimento, clara visão do propósito e por último confiança. Acredito que o último item seja um dos mais importantes, pois sem confiança os indivíduos de um time se protegem dentro de suas armaduras e acabam não demonstrando suas fraquezas. Como consequência esse tipo de comportamento acarreta um desgaste desnecessário de energia e tempo para as organizações e indivíduos.